Agricultura, a profissão mais antiga do mundo

Na Santa ceia Jesus utilizou o pão e o vinho, alimentos nobres produzidos desde os primórdios. A humanidade evoluiu, mas nunca deixou de ser dependente do alimento, que é integralmente produzido pelo agricultor.
01/08/2023 09:08
16 minutos de leitura
Agricultura, a profissão mais antiga do mundo

Ao se levantar pela manhã a primeira coisa que você faz é lavar o rosto e escovar os dentes, mas nem se liga que a escova e a pasta de dentes têm suas matérias primas no campo. Depois veste suas roupas, feitas com fios de seda ou de algodão, produzidos pelo agricultor. Calça seu sapato, que também não estaria ali, não fosse o trabalho do pecuarista. Aliás, até a cama, os lençóis, o travesseiro e o pijama que você usou para dormir.

Em seguida senta-se à mesa para tomar café. Ali está o pão, o leite, o café, o açúcar, a manteiga... tudo produzido pelo agricultor. Até a mesa e a cadeira têm origem lá. Chega no trabalho e logo pega um papel na mão, ou muitos, e nem percebe que a celulose é outro produto da terra. E assim passa uma rotina diária consumindo alimentos e produtos industrializados na cidade, mas que foram gerados pelas mãos dos agricultores.

Pensando nisso, o que seríamos nós sem essas mãos abençoadas?

Dia 28 de julho é dia do agricultor e para homenageá-los vamos conversar com um agropecuarista, que também é uma liderança do agro regional, Paulo Roberto Orso. Ele tem suas origens na agricultura, onde continua produzindo leite, aves e grãos. É formado em engenharia agronômica e há 11 anos preside o Sindicato Rural Patronal de Cascavel. E como todo agricultor, é muito ligado à Igreja. A família pertence à paróquia Santo Antônio, mas também colabora como voluntário nas festas da Catedral, do Seminário e do Cancelli.

 

RV NSA: Qual análise você faz do trabalho do agricultor nos dias de hoje?

PAULO: Hoje, como ontem, o trabalho do agricultor sempre foi muito importante. É uma das profissões mais antiga do mundo, pois desde o seu princípio o homem se alimentou com o que vem da agricultura e essa é a principal missão da família do campo.

 

RV NSA: Como você vê a relação campo X cidade? Podemos dizer que são totalmente dependentes?

PAULO: Eu diria que a dependência é muito grande da cidade em relação ao campo. Talvez não haja uma convergência de conhecimento de ambas as partes. O produtor não é muito lembrado, porque se fala muito pouco da importância e da real existência do homem do campo, e por isso mesmo essa interação ainda está muito longe de acontecer. A aproximação depende dos dois lados e deve começar na sala de aula, na educação da criança e do jovem urbano, pois a dependência da cidade é daquilo que não passamos sem: o alimento, o vestuário e tudo mais que vem da lavoura, mas nem todos tem essa informação. Inclusive a grande geração de emprego, no Oeste do Paraná por exemplo, mais de 1/3 dos empregos vem do agro. Tudo começa com o agricultor, que é a mola propulsora. Depois dele é que vem a indústria, que fomenta o mercado.  Essa força faz a geração de emprego, e a economia girar, tudo começa por lá, então o ideal seria que tudo girasse melhor, em sintonia.

 

RV NSA: Porque às vezes é difícil para alguém da área urbana reconhecer o valor do trabalho agrícola?

PAULO: Porque o homem do campo não sabe vender sua imagem e sua real importância, assim como o urbano não tem o conhecimento porque ninguém lhe conta. Então pensa que o leite vem da caixinha, o arroz da indústria, e assim por diante, não sabe como é a rotina da produção para esse alimento chegar até ali. E assim é com toda a produção primária.

 

RV NSA: Você conhece bem essa profissão. Como é o dia a dia de um produtor rural, ou de uma família de agricultores?

PAULO: Eu nasci e cresci no campo e continuo na produção agropecuária. Meu avô era produtor de madeira e foi um dos pioneiros dessa região. Eu comecei como entregador de leite, quando podia deixar o litro de leite in natura no portão da casa, então posso dizer com conhecimento, que o dia a dia de uma família é bem puxado, começa muito cedo e termina muito tarde, porque são muitas atividades, muitos afazeres. Levanta-se antes do sol nascer e só descansa depois que o sol se põe... Começa alimentando os animais, ordenhando, depois vai pra lavoura, volta para alimentar os animais novamente, e assim sucessivamente. E é a família toda que trabalha, e trabalha muito, às vezes com sol, outras com chuva, e inclusive nos fins de semana e feriado, pois assim como nós, os animais também não podem ficar sem comida.

 

RV NSA: As famílias do campo são, em sua grande maioria, muito religiosas e atuantes em suas comunidades. De onde vem essa fé?

PAULO: Isso vem desde os primórdios da colonização, porque quando vieram os primeiros colonizadores, sempre vieram impregnados de fé e vontade de vencer, tanto que a primeira coisa em uma comunidade fazia era a construção de uma igreja e tudo ali girava em torno dela. O padre era a liderança mais importante, era o educador, o psicólogo, o médico, o conciliador, enfim tudo. Era o homem representando Deus, e as festas, quermesses, tudo girava em torno da igreja, que ainda é o pilar mestre do homem do campo, pois essa fé e sentido de pertencimento continua sendo cultivada até hoje nas comunidades do interior. Em muitos lugares é assim até hoje, se for lá, um é ministro, outro catequista, outro cuida da administração e assim segue, gerando unidade e envolvimento entre as famílias moradoras. Cria-se uma vida em torno da fé. E como se diz: lá nos rincões da terra tem o homem e Deus e, na sua atividade, tem todo o tempo para falar com o Pai.  

 

RV NSA: A ligação com a natureza também ajuda nessa aproximação com Deus?

PAULO: Ajuda muito, pois se está trabalhando na lavoura ou com os animais, está em contato com a natureza, que é a essência da sua vida, e por isso é um preservador por excelência. O agricultor é quem mais preserva o meio ambiente, apesar da falta de compreensão dos urbanos, ele é o que mais cuida da mata, da água, dos animais silvestres... e se não árvores ele planta.  

 

RV NSA: Se o ser humano não vive sem o alimento, podemos dizer que a missão do agricultor é sagrada?

PAULO: Sem dúvida nenhuma. É uma missão sagrada e todos dependemos dela. O alimento não cai do céu e a nutrição faz parte da nossa vida desde o dia em que nascemos.

 

RV NSA: Também é da produção agrícola que vem a uva e o trigo, que se transformam em pão e vinho, muito citadas na Bíblia e presentes em todas as celebrações católicas. Como você vê essa relação?

PAULO: Desde o princípio, a agricultura é vista como sagrada. Desde o princípio era o trigo que alimentava o povo. As comunidades plantavam e colhiam em conjunto e guardavam a produção para passar o ano todo se alimentando. Era a maior riqueza que se tinha. Há muitas profissões importantes, mas a produção de alimentos é para a preservação da vida.

 

RV NSA: Se ¼ da população mundial come o que sai da nossa terra, como ficaria o mundo sem o agricultor brasileiro?

PAULO: ‘Acabe a cidade e o campo a reconstruirá. Acabe o campo e a cidade morrerá’! Ou seja, sem o homem do campo não existe cidade e não existe alimentação para a humanidade, que morreria pela fome. Além disso, toda a economia do país gira em torno do agro, que é a grande mola propulsora do desenvolvimento, gera riqueza para toda a sociedade, com empregos, renda, impostos... enfim, faz com que toda a grande máquina possa funcionar.  

Quando falamos do Brasil, que é responsável por um ¼ da alimentação do mundo, e até 2050 teremos que alimentar quase a metade da humanidade, vemos a importância com a qual o governo deveria olhar para o setor, pois é dele que virá a grande transformação. É o nosso maior patrimônio, temos sol, luz, solo, qualidade de vida e sanidade agropecuária, então, se o Brasil conseguisse fazer uso dessa produção para alimentar toda a população do país, não teria fome, e com o excedente exportado traria recurso financeiro para todas as outras políticas públicas e programas sociais, garantindo sustentabilidade e fazendo desse o melhor país do mundo.

 

RV NSA: Diante desse momento conturbado que o agro vive, pergunto: estamos perdendo a esperança de construir juntos um mundo melhor? Podemos reverter isso?

PAULO: Ao longo da humanidade, a fé, as ideologias e a falta de políticas públicas vieram fazendo uma inversão de valores e criou um distanciamento. E essa inversão precisa ser revertida, com educação e com informações verdadeiras aos jovens. Hoje temos muita dificuldade em sermos reconhecidos. Antigamente o produtor rural era considerado de uma casta inferior, hoje é visto como uma das mais importantes profissões, mas ainda pouco respeitada. Então é preciso resgatar o respeito, com a restauração dos verdadeiros valores superando as ideologias. A tecnologia substituiu os valores, que foram substituídos pela ideologia, então, retiremos as ideologias e reimplantemos os valores que aí teremos condições reais de uma sociedade muito melhor.

Fonte: Revista Nossa Senhora Aparecida