Trajetória de vida de Dom Lúcio Ignácio Baumgaertner

Em um reduto de italianos nasceu uma vocação de família alemã
10/04/2023 08:04
14 minutos de leitura
Trajetória de vida de Dom Lúcio Ignácio Baumgaertner

Em 2007, o arcebispo dom Lúcio Ignácio Baumgaertner, tornou-se emérito, ao renunciar o episcopado e ceder lugar para Dom Mauro Aparecido dos Santos (In Memoria). No entanto, continuou sendo presença em inúmeros eventos e na vida da igreja local, exercendo suas funções de serviço ao próximo e a Deus. Até que, no último dia 01 de abril, Deus o convidou para fazer parte do seu reino no céu. Assim partiu, aos 91 anos de idade, sendo 66 deles dedicados ao sacerdócio.

Filho de José Baumgaertner e Ottilia Flach Baumgaertner, dom Lúcio nasceu em Farroupilha - RS, no dia 02 de setembro de 1931. Foi ordenado Padre no dia 1 de dezembro de 1957, em Bento Gonçalves, Rio Grande do Sul, aos 26 anos de idade e estava desde 1997 em Cascavel.

Em Toledo foi o terceiro bispo, tendo exercido sua função entre 1983 e 1996, quando foi transferido para cá, onde assumiu o posto de segundo arcebispo da arquidiocese metropolitana, com a aposentadoria de Dom Armando Círio (In Memoria).

 

A vocação

Os pais vieram da Alemanha, do Vale do Rio dos Sinos, para construir a vida no Brasil, e aportaram em um lugarejo chamado Vila Nova Milano, município de Farroupilha, onde nasceu o menino Lucio Ignácio Baumgaertner e seus seis irmãos. “Esta vila era considerada o centro da imigração italiana do RS, pois para essa comunidade vieram os italianos, em 1875, para dali partir e se espalhar para a região serrana do Estado”, contou ele em entrevista concedida à Revista Catedral em 2019.

De acordo com seus relatos, nesse vilarejo havia apenas duas famílias que não eram italianas, ambas alemãs e de sobrenome Baumgaertner. E foi justamente dessa convivência com os italianos, por natureza muito religiosos, que o jovem Lúcio despertou para a vida sacerdotal. Tanto é que, além dele que se tornou bispo, desta comunidade surgiram outros 15 sacerdotes, entre eles um irmão de dom Lúcio, e mais 75 freiras.

Dom Lúcio ingressou no seminário em 1945, aos 12 anos. Cursou o 1º e o 2º Graus no Seminário Menor N. Sra. Aparecida, em Caxias do Sul. Em seguida foi cursar Filosofia e Teologia no Seminário Central Imaculada Conceição, de São Leopoldo-RS, finalmente foi para Viamão-RS, onde cursou Licenciatura em Filosofia, Pedagogia, Orientação Educacional e Ciências Jurídicas (direito).

Como padre teve como lema, coríntios 9:22, que fala, ‘fiz-me tudo para todos, a fim de salvar a todos’, que, nos dá uma visão pastoralista da vida em busca do reino de Deus, onde todas as pessoas coparticipantes deveriam alcançar o bem-estar, a felicidade.

Durante a sua vida sacerdotal passou por diversos lugares e funções como: Cooperador na Paróquia de Nossa Senhora de Lourdes, em Caxias do Sul no ano de 1958; Professor no Seminário Diocesano de Nossa Senhora Aparecida, também em Caxias do Sul até 1961; Pároco de São Domingos, na cidade de Torres, entre 1961 e  1965; Reitor do Seminário Diocesano de Nossa Senhora Aparecida; Pastoral da Juventude e Pastoral Familiar e Cooperador da Catedral Diocesana, Professor na Universidade de Caxias do Sul entre 1965 e 1970; Professor e Pároco da Paróquia Santo Antônio, no mesmo município, até 1982 e, por fim, Pároco na paróquia Santo Antônio, de Bento Gonçalves, onde permaneceu até 1983.

Ainda em Caxias do Sul, lecionou em colégio publico estadual com três mil alunos, onde dedicava todas as manhãs ao ensino e à tarde na pastoral da comunidade religiosa.

Em 12 de outubro de 1983 foi ordenado bispo em Caravaggio, Farroupilha/RS, quando foi enviado para ser o terceiro bispo da diocese de Toledo. Ali permaneceu até 1996; quando assumiu o cargo de Arcebispo de Cascavel, com o emérito de Dom Armando Círio, onde exerceu a função até 2007. Ocupando, paralelamente, o cargo de Presidente do Regional Sul 2 da CNBB. Em 31 de dezembro de 2007 tornou-se Arcebispo Emérito de Cascavel

Dom Lúcio contou à época, que sempre deu muita importância à família, de quem procurou estar próximo e manter contato durante toda a vida. Dos sete irmãos, quatro descansam no reino de Deus e duas irmãs ainda residem em Vila Nova Milano, cidade de origem da família.    

 

Retrospectiva de vida

Foi uma longa caminhada, tendo a vida sacerdotal e episcopal, sempre voltada ao ensino e ao pastoreio. Tanto que, para a ordenação de bispo escolheu como lema, ‘para que todos tenha vida, e a tenham em abundância’. Portanto, tanto o lema de ordenação sacerdotal como de bispo, sempre tiveram a visão ampla, sobre situações em vista de todo o povo de Deus, e que todos eram escolhidos para serem do rebanho de Cristo.  

É evidente que houveram dificuldades, principalmente na constituição das dioceses, relacionadas à sua estruturação e organização, mas em nenhum momento afetaram o trabalho de pastoral, de quem sempre aproveitou as oportunidades e a liberdade para exercer o ministério.

Na ocasião da reportagem Dom Lúcio lembrou de fatos importantes que marcaram a sua trajetória. Um deles foi durante o episcopado, de cinco em cinco anos ocorriam visitas à Roma, agendadas pela Santa Sé, para encontros dos bispos com o Papa. “Íamos para Roma, para sermos recebidos em momento muito especial, e tínhamos 20 minutos individualmente a cada bispo, sempre com conversa animadora, cheia de esperança e alegria, e, no meu tempo, houve o papa, hoje santo, São João Paulo II, que sempre imprimiu na vida dos bispos um espírito altamente religioso, de fé, muito amor e muito carinho. Ele foi um sinal de vida exemplar para todos nos”, contou ao explicar que nessas oportunidades também ocorriam reuniões com os decastérios (departamentos do governo da Igreja Católica que compõem a Cúria Romana) onde eram repassadas todas as orientações para a atuação das Dioceses.

Outro Fato que considerou importante em sua trajetória, foi sua indicação pelos bispos do Paraná, para a presidência do Regional Sul 2 da CNBB, onde atuou por oito anos, fazendo visitas às dioceses e participando de reuniões, eventos e coordenando as atividades dessa regional.

Por duas ocasiões foi congratulado com o título de Cidadão Honorário, uma vez em Cascavel e outra em Toledo, o que considerava como reconhecimento pela presença, atuação, simpatia e pelo amor que dedicava a todo o povo. “Uma manifestação de apreço dos municípios para com a pessoa do bispo”, dizia ele.

Dom Lúcio dizia ver seu dever cumprido ao olhar para trás.  E assim sabia agradecer a Deus por tanta bondade, tanto amor e iluminação, para que pudesse exercer o seu ministério com tranquilidade, fazendo dele um sinal de vida e de esperança para todos. “Não tenho memórias que desejasse apagar por serem tristes, não, a minha vida sempre foi muito tranquila em benefício de todo o povo”, disse ele naquela ocasião.

 

Um corte na linha do tempo

O arcebispo emérito viveu antes e depois do Concílio Vaticano II. Duas experiências bem distintas. Ele lembrava que desse período em diante a vida na Igreja modificou muito, tanto na ação pastoral como no entendimento interno. Foram duas fases na sua vida, uma antes e outra depois do Concílio. É evidente que cada tempo tinha suas dificuldades e maneiras de ser e de se adaptar à nova realidade. Aliás, este foi um trabalho constante para ele, o de se adaptar, visualizar e acompanhar a evolução do tempo, para dar um sinal de vida ao seu povo.

Sobre os tempos modernos, Dom Lúcio percebia que atualmente os leigos participam mais das ações e da vida da Igreja, o que vem auxiliar aos padres no exercício de suas funções ministeriais. “É evidente que a igreja se abriu, tanto pelo Concílio, quanto pelas reuniões dos bispos em Roma, tanto assim que a vida da igreja foi se formando constantemente na responsabilidade também do leigo, as pastorais foram acompanhadas e dirigidas por leigos, que na sua sabedoria souberam dar um bom encaminhamento, por isso a caminhada da igreja, embora ainda tenha suas dificuldades, tem também suas adaptações, mas segue no crescimento vivencial de fé e de esperança do povo”.

Ele também acreditava que a vida em comunidade é uma constante evolução e dizia ter esperança de que a graça do senhor acompanhe sempre a atuação de seu povo, pois “Jesus veio para salvar o seu povo e ser vida, e esta deve agir sempre, tanto nas situações adversas, quanto nas situações em que o espírito das pessoas se volta mais para Deus”.

Fonte: Revista Nossa Senhora Aparecida
Tags: